domingo, 28 de agosto de 2011

Tudo sobre sujeito indeterminado

Como diferentes idiomas lidam com a indeterminação do agente na frase

Uma das noções que mais causam dificuldade no estudo da gramática é a de sujeito indeterminado, que muitos confundem com as orações sem sujeito, isto é, as que expressam existência (“Há leões na África”), tempo transcorrido (“Faz dias que não o vejo”) e fenômenos atmosféricos (“Choveu muito ontem”).
Diz-se que o sujeito é indeterminado quando não é possível determinar que elemento da oração funciona como sujeito (pelo menos essa é a definição dada pelas gramáticas escolares). Não vou comentar aqui a adequação ou não de tal definição, o que daria margem a outro artigo, mas apenas utilizá-la como ponto de partida para discutir como as línguas expressam essa noção.

O latim clássico já dispunha de três construções para dar conta de uma ação sem mencionar quem a praticou. A primeira era o uso da terceira pessoa do plural com sujeito oculto (dicunt, “dizem”), a segunda era o uso da voz passiva (dicitur, “é dito”) e a terceira era o emprego de um pronome indefinido (aliquis dicit, “alguém diz”).

As línguas europeias herdaram esses processos, mas também desenvolveram outros que, na verdade, são derivações deles.

Por isso, podemos dizer que hoje há quatro modos básicos de indicar o sujeito indeterminado: “uma pessoa”, “as pessoas, a gente”, “eles, elas” e o uso da voz passiva.

Vamos analisar cada um desses modos, separadamente.

Formas de indeterminação

No latim vulgar, “diz-se” se expressava como dicunt (tal qual o latim clássico) ou como homo dicit, literalmente, “uma pessoa diz” (note-se que homo significa “homem” no sentido de “ser humano, pessoa, indivíduo”, distinguindo-se de vir, que é o macho da espécie humana).

Essa é a origem do francês on dit. O fato de o pronome indefinido on ter-se originado de um substantivo é o que permite que também seja usado com artigo definido: l’on dit.
Essa construção do latim vulgar foi seguida pelo antigo alemão, cujo pronome indefinido man tem a mesma etimologia de Mann (“homem”) e Mensch (“ser humano”). Em alemão moderno, “diz-se” é man sagt. A mesma construção existe nas demais línguas germânicas, à exceção do inglês.

Aliás, o pronome indefinido sueco man (de man säger, “diz-se”) é cognato do substantivo man, “homem” (de en man säger, “um homem diz”). Da redução de “um indivíduo” para “um”, temos o italiano e o espanhol uno dice, bem como o inglês one says.

Outro modo de indeterminar o sujeito é referir-se a um vago “as pessoas, a gente em geral”. É daí que veio a nossa cada vez mais popular construção “a gente diz”.

Em holandês, o plural de man, “pessoa”, passou com o tempo a funcionar como pronome indefinido: men zagen, “pessoas dizem”. Depois, quando men perdeu o sentido de “pessoas” e tornou-se mera palavra gramatical, surgiu a construção no singular men zaagt.

O terceiro modo de expressar a indeterminação do agente é substituir “as pessoas” por “elas”, podendo nas línguas românicas esse pronome vir oculto. Trata-se do mesmo processo encontrado no latim dicunt, isto é, uma terceira pessoa do plural com sujeito elíptico.

Essa construção corresponde ao português dizem, ao espanhol dicen, ao italiano dicono e ao inglês they say, este com pronome pessoal explícito, já que o inglês não admite pronome oculto.

Voz passiva

Finalmente, a construção com voz passiva (latim dicitur) continuou a ser usada nas línguas modernas. Algumas delas só conhecem a passiva analítica (“é dito”). Exemplo disso é o inglês it is said.
Já as línguas que admitem voz passiva sintética têm ambas as formas: em português, “diz-se” ou “é dito”, em espanhol se dice ou es dicho, em italiano si dice, è detto, viene detto ou ainda va detto.Quando o verbo é reflexivo ou pronominal, o português, o espanhol e o italiano substituem a partícula apassivadora se/si por “a gente”,: port. “a gente se lembra”, esp. uno se acuerda, it. ci si ricorda.

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