quarta-feira, 30 de março de 2011

A dupla negativa e o pronome indefinido "todo"

A dupla negativa e o pronome indefinido "todo"

Sobre a dupla negativa

"Não fiz nada." "Não vi ninguém." Essas são frases comuns no dia-a-dia, mas suscitam o questionamento de muitos leitores, que, apoiados num raciocínio lógico, consideram impróprio negar duas vezes. Argumentam que dizer que "alguém não fez nada" significa dizer que "alguém fez alguma coisa". Quem não viu ninguém viu alguém.

Pode o raciocínio ter lógica, mas não é assim que funciona a língua. Em português, a negativa antecede o verbo, de modo que não temos de afirmar antes de negar. Vale aqui um parêntese: há regiões em que se registram, sobretudo na fala, expressões do tipo "Fiz não", "Sei não" etc., em que a negativa se coloca depois do verbo.

São, entretanto, construções mais comuns na oralidade e é possível que decorram do encolhimento de uma construção enfática do tipo "Não fiz, não", "Não sei, não", em que a segunda negativa tem mais realce que a primeira.

Fechado o parêntese, observamos que, na norma culta, o comportamento da língua é o de a negativa anteceder o verbo. Daí o fato de não se ouvirem sistematicamente construções do tipo "fiz nada" ou "vi ninguém". Ocorre, isto sim, a dupla negativa, que tem valor enfático ("Não fiz nada", "Não vi ninguém").

No caso de uma inversão sintática, uma só negativa é suficiente: "Nada fiz", "Nada sei sobre isso"; Na ordem direta, todavia, a negativa se repete: "Não sei nada sobre isso".

Essa dupla negativa nada tem a ver com outra, esta sim, problemática. Há verbos no português que têm sentido negativo: é o caso de "impedir" ou de "evitar", por exemplo. "Impedir" é não permitir, "evitar" é fazer que não aconteça.

Se não impedimos que uma coisa aconteça, essa coisa efetivamente acontece; se não evitamos que uma coisa ocorra, essa coisa ocorre. Nesse tipo de construção, a palavra negativa antepõe-se a um termo de significado negativo e, dessa maneira, nega-se a negação, produzindo-se uma afirmação.

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